terça-feira, 26 de junho de 2012
Da invenção do proletariado
"Religados e reanimados no monstro estão os membros daqueles – os 'pobres' – que a quebra das relações feudais empurrou para a vagabundagem, a pobreza e a morte. Apenas a ciência moderna (…) lhes pode oferecer um futuro. Cose-os de novo, molda-os de acordo com a sua vontade e, por fim, dá-lhes vida. Mas, no instante em que o monstro abre os olhos, o seu criador encolhe-se, horrorizado.” (Franco Moretti, aqui ) Deu vida a algo que tem 'vida própria', por mais preso que esteja na relação com o seu 'dono'. E tanto mais será o horror quando, como observou o meu amigo Ben Dawson, a quem devo esta referência, o monstro começa a vaguear, porque está sem trabalho.
domingo, 24 de junho de 2012
Contributo menor para o futuro da esquerda
(o meu artigo no i da última quinta-feira)
De há uns tempos a esta parte, os debates sobre o futuro
da esquerda em Portugal têm sido alimentados por alguns contributos que afirmam
ter chegado o tempo da unidade. Estes contributos vão de rigorosos exercícios
de cálculo eleitoral a comoventes desabafos de alma, mas eu queria colocar aqui
três entraves à famigerada unidade.
O primeiro
entrave tem que ver com uma divisão entre, de um lado, quem coloca mais empenho
na reivindicação da democracia do que na crítica do capitalismo e, do outro,
quem mais se dedica a combater o capitalismo e menos preza a luta pela
democracia. Esta divergência entre quem acha que a esquerda é sobretudo nome de
uma luta pela liberdade política e a quem acha que a esquerda é sobretudo uma
luta pela igualdade económica não se resolve através da busca de um mínimo
denominador comum, como alguns pretendem, mas maximizando: precisamos de uma
esquerda que assuma que a sua luta deve ser simultaneamente uma luta radical
pela igualdade económica e um combate sem tréguas pela liberdade política.
Precisamos de uma esquerda ciente de que não há combate ao capitalismo que não
seja luta pela democracia e vice-versa. Um exemplo, entre outros possíveis, de
uma tal esquerda estaria numa política que travasse os combates pela liberdade
de expressão não apenas como uma luta por direitos políticos ou pela liberdade
de imprensa, mas também como uma luta pelo direito de todos os trabalhadores a
não passarem a maior parte do dia e dos dias a fazerem o que não querem e sob o
comando de outrem.
O segundo
entrave à unidade tem que ver com as formas de poder que as esquerdas preconizam
e praticam. Aqui há também uma divergência fundamental. No actual mundo das
palavras, à direita como à esquerda, um dos casos de maior sucesso é
provavelmente o da chamada elite, termo que circula com o maior à vontade por
entre peças jornalísticas e discursos parlamentares, saltando de livros de
História para o verbo de politólogos. Colada à boca de quase todos, a palavra
não é, porém, usada de um modo sempre idêntico. Há quem a utilize de maneira
elogiosa e quem dela faça uso com intenções críticas. E entre estes últimos
cava-se uma distância que não é menor entre, por um lado, os críticos da elite
que a depreciam porque entendem que é necessário apurarmos uma nova elite que
substitua a velha elite e, por outro, os que a rejeitam porque simplesmente acreditam
que um compromisso radical com a democracia deve simplesmente riscar a palavra
do seu dicionário. Há uma bifurcação, sem ponto de convergência à vista, entre
quem entende que a esquerda deverá ser sobretudo nome de um projecto que visa
derrubar governos de direita e substituí-los por governos de esquerda e quem
julga que a esquerda é antes de mais o nome de um projecto de combate à
elitização da política, isto é, um projecto de crítica democrática da
democracia representativa. Eu estou com estes últimos – nenhum combate político
à esquerda pode continuar a ser travado com recurso às velhas fórmulas
hierarquizantes em que uns dirigem e outros são dirigidos, uns planeiam e
outros são planeados, uns pensam e outros são pensados; dirigentes revolucionários
ao leme da vanguarda partidária e economistas reformistas que analisam a
sociedade do alto do Estado devem ser atirados para o caixote de lixo da
história.
Finalmente,
o terceiro entrave é a obsessão com as frases claras e o estilo categórico, que
podem parecer úteis para combatermos a direita, mas que a médio prazo pagaremos
caro. Isto é, não pesemos excessivamente as nossas preocupações e as nossas
propostas, o que naturalmente abrange as que fazem parte deste meu
contributo... Não percamos muito tempo a demarcar o que está dentro e o que
está fora dos nossos territórios. E isto não é só válido para os partidos ou
para os partidos que são apodados de ortodoxos. Aplica-se seguramente ao
manifestante anti-autoritário que ao atirar ovos à sede de um partido de
esquerda se limitou a erguer as paredes do seu próprio partido e a fazer-se
capataz do que deveria ser indomável, o anarquismo. E aplica-se também aos que
em nome da unidade dos partidos de esquerda decidem simplesmente tecer armas
contra todos os sectarismos de todos os partidos de esquerda, como se a sua
resposta à fragmentação partidária da esquerda fosse simplesmente criarem mais
um fragmento que, por lhe chamarem unidade, é suposto não tomarmos como mais um
fragmento. Infelizmente, fazer bandeira da heterodoxia é caminho rápido para
chegar a ortodoxo.
quinta-feira, 21 de junho de 2012
Anos é forti - Santa Filomena, Amadora
Hoje, quinta feira 21 de Junho, pelas 10h moradores e moradoras do Bairro de Santa Filomena (Amadora) dirigiram-se pacificamente à Câmara Municipal de Amadora para entregar uma carta ao cuidado do Presidente da Câmara Municipal da Amadora. Chegamos lá, tiramos a senha para ser entendidos/as e depois de ler e assinarmos a carta o nosso objectivo era entregá-la aos/às funcionários/as da Câmara para que ela fosse remetida ao Presidente. Mal entramos, completamente pacificamente, como qualquer cidadão ou cidadã deve poder entrar na sua câmara municipal e ser atendido/a, foi incompreensivelmente chamada a policia municipal que veio em massa.
Somente estávamos à espera da nossa vez para entregar a carta assinada por nós. Ainda assim, tendo em conta o contigente policial, à medida que tinhamos assinado a carta , fomos saindo do edifício e a polícia, depois de ter feito um cordão policial , hostilizou os moradores e moradoras e perante o pedido de calma à polícia por parte de uma pessoa que integra a Plataforma pelo Direito à Habitação , explicando que somente queríamos entregar uma carta, um agente policial agrediu-a violentemente, estando ela neste momento ainda no hospital.
A polícia agrediu igualmente um repórter que estava a documentar e retiraram-lhe o cartão de memoria que continha mais fotos e video das agressões. Depois disso acontecer os/as moradores/as manifestaram-se em frente à Camara aguardando que um morador que foi detido fosse libertado, que a colega que foi agredida fosse atendida pelo INEM e levada para o hospital e que nos deixassem entregar a Carta endereçada ao presidente da Câmara.
A actuação da policia municipal foi completamente injustifícável e viola os nossos mais elementares direitos.Enviamos em anexo as únicas fotos que foram tiradas por um morador desde seu telemóvel (foto em anexo), mostrando a agressão , bem como a carta que foi entregue.
Os/as moradores/as do Bairro de Santa Filomena
Plataforma pelo Direito à Habitação
Pode-se ler abaixo a carta que os moradores desejavam entregar na C.M.A.
segunda-feira, 4 de junho de 2012
O processo da Fontinha desmontado como se fosse um esquentador velho - "Proselitismo na via da educação" e "internacionalismo alarmante"
Durante o despejo do Espaço Colectivo Autogestionado (Es.Col.A) do Alto da Fontinha, no Porto, no passado dia 19 de Abril, dois dos detidos, António Pedro Sousa e Ricardo Ribeiro, foram acusados de crime de injúria e crime de resistência e coacção sobre funcionário. Em julgamento sumário, no dia 2 de Maio, foram ambos condenados a pena de prisão de três meses, substituída por multa mais pagamento da taxa de justiça, num total de €954 cada, segundo sentença lida a 10 de Maio.
Vimos por este meio enviar, em anexo, cópia do Recurso da sentença - que deu entrada no Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto, 3ª Secção, no passado dia 1 de Junho - de forma a que este seja divulgado e ponha a nu a farsa que foi este julgamento nitidamente político. Junta-se também em anexo cópia dos factos alegadamente provados em Tribunal, contestados no Recurso. Refira-se que o documento referente ao recurso é antecedido de um índice, com links e bookmarks para facilitar o manuseamento.
Denunciamos a violação do processo equitativo, violação do princípio da legalidade, ausência do respeito devido às instituições vigentes, plausibilidade da ausência de defesa efectiva, de onde ressalvamos:
O facto da Procuradora do Ministério Público (MP), que representa a fiscalização da Lei, ter nas suas alegações finais tecido considerações na primeira pessoa do singular sobre as convicções políticas dos arguidos, acusando-nos de "proselitismo na via da educação" e de um internacionalismo alarmante. Chegando ao cúmulo de ter dito que "se não queremos suportar situações que não nos agradam, vivemos isolados na Serra da Lousã". E o facto da Procuradora do MP e do Juiz de Direito do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto - 3ª Secção terem, com toda a evidência e à vontade, conduzido os testemunhos de acusação e ignorado os de defesa.
E fica a dúvida, uma vez que nada ficou provado, o que é que afinal sustenta a acusação?
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