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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Inevitabilidade, o significante flutuante do momento

Em tempo de inevitabilidades nada como voltar às raízes e reler os clássicos. Ou, como diriam Althea & Donna: «nah pop no style, a strictly roots»

O ponto de partida desta reflexão era na maior parte dos casos um sentimento de impaciência perante o «natural» de que a imprensa, a arte, o senso comum revestem sem cessar uma realidade que, embora sendo aquela em que vivemos, nem por isso é menos histórica: numa palavra, sofria ao ver a cada momento confundidas, na narração da nossa actualidade, a Natureza e a História, e queria captar na exposição decorativa do que se dá como evidente o abuso ideológico que, em meu entender, nele se esconde.

Roland Barthes, Mitologias (1957)


quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Horizontes da memória. Ser benfiquista é ter na alma a chama imensa do colonialismo português (Iª parte)

Temos a braços uma Greve Geral para a qual todos os esforço de «unidade, unidade, unidade do trabalho contra o capital» são poucos. Mas não podemos declinar uma viagem a uma ideia de passado «glorioso», ideologicamente incólume, que os mitólogos de uma agremiação lisboeta se esforçam por reproduzir. Na tese VII «sobre o conceito da história», Walter Benjamin refere que o materialismo histórico conseguiu acabar de vez com o método da empatia, cujas origens «encontram-se na indolência do coração, a acedia, incapaz de se apoderar da autêntica imagem histórica que subitamente se ilumina». A empatia tolda juízo, a crítica historiográfica e varre para debaixo do tapete os acontecimentos do passado que não se adequam à imagem idílica que nele gostaríamos de ver projectada.

Segue a história de um acontecimento do passado, um autêntico documento de barbárie para quem escova a história a contrapelo, mas que os prosélitos do benfiquismo resolveram omitir. No início da década de 1960, o Benfica era o único clube português que dispunha de duas publicações oficiais: O Benfica Ilustrado (mensal) e jornal O Benfica (semanário). Estas duas publicações faziam eco das grandes epopeias do clube encarnado, glorificando os seus feitos e exacerbando as suas vitórias. Mas não só. Quando o fascismo começou a ruir, os órgãos oficiais do clube juntaram-se a coro de indignação nacional, lamentando a perda de Goa, Damão e Diu em 1961, as jóias da coroa do imperialismo português. A indignação patriótica e de direita chegou à primeira página do jornal O Benfica, que num editorial intitulado «Viva Portugal!» dizia:

«Não! Não há qualquer forma de sentimento, não há qualquer, maneira de pensar que resista ao amor da Pátria, que deixe de vibrar quando a terra portuguesa, nada e criada pelo sangue dos nossos maiores, é assaltada pela horda assina e cruel que mata, que rouba. (...) Agora só há Portugal! Agora só pode haver um coração, só pode existir um sangue do mesmo tipo, só pode aflorar uma palavra aos nossos lábios, aquela que nossos Pais nos ensinaram a amar desde que nascemos e que depois de crescidos compreendemos ser a única que, acima de tudo, devíamos amar e conservar – PORTUGAL! (...) Portugal, afrontado, sangra de dor! Portugal, bem ferido, chora os que perderam a vida no solo que durante centenas de anos foi cultivado pelas suas gentes e que, de um dia para o outro, se vê arrasado, destruídos pelos bárbaros da nova vaga, por aqueles mesmo bárbaros que no seu país não conseguem matar a fome aos muito milhares de miseráveis que por lá pululam num espectáculo degradante, indigno, impróprio de gente que se julga civilizada» (O Benfica, 21 de Dezembro 1961)